Geral
São Silvestre - parte 2, por Bruna Girotto

Acordei cedo no dia 31. Acho que era a ansiedade para participar da São Silvestre. A família decidiu almoçar no Mercadão Municipal de São Paulo. Alguns queriam saborear o famoso pastel de bacalhau, e outros o sanduíche de mortadela. Eu não podia nem pensar nisso, já que algumas horas depois correria. Eu almocei uma macarronada com molho de tomate e carne moída. Meu irmão petiscou o pastel e o sanduíche que a esposa estava comendo. Corajoso ele!
Às 14h saímos do hotel rumo à avenida Paulista. Fomos a pé até a largada. No caminho, encontramos um rapaz do Pará, atleta profissional, que sairia logo atrás do primeiro pelotão de elite. Meu pai aproveitou para entrevistá-lo.
Existe uma ordem de largada. Às 17h sai o pelotão de elite feminino. Vinte minutos depois sai o pelotão de elite masculino, onde estão os atletas internacionais e os nacionais que são convidados pela prova. Em seguida, tem mais dois pelotões de elite, em que o atleta tem de comprovar ter participado de provas e ficado bem classificado, bem como tem de pagar um valor de R$600 a R$800 (se não me engano). E, por fim, somos nós, pobres mortais, o famoso pelotão geral.
O pelotão geral é bem aquilo que a Globo mostra. Quando chegamos, faltando três horas para a largada, já havia cinco mil atletas em pé, alguns segurando faixas, outros fantasiados e outros apenas guardando lugar para sair na frente. Lá você vê de tudo. Desde os sósias do Pelé e do Neymar, até homem fantasiado de noiva, corinthiano pagando promessa com uma enorme Nossa Senhora nas costas, papai noel, índio, enfim, é uma verdadeira festa!
Eu e meu irmão ficamos bem na frente. Tentamos mostrar para o mundo nossa plaquinha escrito \\\"Cassilândia - Mato Grosso do Sul\\\", mas as dezenas de placas que tinham na nossa frente dificultaram muito.
O dia estava nublado, talvez se estivesse com sol seria ainda mais difícil. Ali, começamos a conhecer outras pessoas que já correram a São Silvestre. Tinha um senhor que participava da prova desde a década de 80. Super experiente, estava com uma sacolinha com água mineral. Ali, já vi que eu e o Guilherme erramos. Fomos sem água, e ficamos três horas sem ingerir líquido. Por óbvio, começamos a prova desidratados. Mas, é vivendo que se aprende.
Depois, um grupo de mineiros começou a puxar papo. O mais animado era um senhor de 60 anos, com um corpo invejável para qualquer moço de 20 anos. Ele era negro, alto, com as pernas longas e lisas (reparei isso na hora que estava sentada no chão, descansando um pouco) e havia vencido a batalha contra um câncer de próstata. Um contador de história que ainda tentou nos convencer que ele era cobaia da Nasa.
Existem os momentos chatos. Quando pessoas querem pular a grade para sair na frente. Mas fazem isso depois de horas que estávamos em pé. O povo vaia, joga água, garrafa com xixi (isso mesmo!), fruta e até sapato.
O negócio do xixi é bem nojento. Banheiro químico tem, mas como o pessoal não quer perder o lugar, fazem no chão da avenida Paulista ou em garrafa de água mineral. Ali, na frente de todo mundo mesmo. Uma hora meu irmão alertou: \"Não olhe para trás\".
As três horas de espera foram muito longas e cansativas. Mas, compensou pois em menos de 2 minutos já havia ado a largada. Teve corredor que demorou 20 minutos para ar este local.
Na última hora (entre 16h30 às 17h30), começaram os conselhos dos veteranos. Porém, o mais estranho foi daquele senhor de pernas lisas e longas: \"Olha, se você cair, proteja a cabeça e coloque a mão na região do rim, porque com certeza vão pisar em você\". Naquele momento, eu senti um medo absurdo. E combinei com o meu irmão que ele sairia atrás de mim, para me ajudar, se algum acidente acontecesse.
No fim, estava mais preocupada com a largada do que com os quinze quilômetros. Imagina, você ser pisoteada numa corrida? Seria muito azar.
Amanhã, conto como foi a largada e o percurso da prova.